A Marvel não tinha o respeito que carrega hoje antes de 2002, quando Homem-Aranha de Sam Raimi arrasou nas bilheterias e deu o verdadeiro boom nas adaptações do gênero, possibilitando a empresa a idealizar anos depois seu Marvel Studios e o promissor Universo compartilhado que há 10 anos é uma unanimidade em Hollywood. Claro que durante esse processo houve pequenos escorregões como Demolidor, Motoqueiro Fantasma, Elektra e até Homem-Aranha 3, onde foi mostrado pela primeira vez o vilão Venom no cinema.
Criado em 1988 em Amazing Spider-Man #300 de David Michelinie e Todd McFarlane, Venom foi um marco dos anos 90 e o seu estatuto foi aumentando e aumentando.Mais de 10 anos depois de sua aparição nas telonas, o personagem ganha seu filme solo, sendo ele o abre-alas pra o Spider-Verse, universo que a Sony quer explorar dos personagens do famoso aracnídeo, enquanto ele transita com os Vingadores no MCU devido ao acordo dos estúdios.
Com modificações acertadas para se adequar às limitações de roteiro – ao não se poder usar todos os elementos necessários para um filme de origem próprio ao personagem – Na trama, Eddie Brock (Tom Hardy) é um jornalista investigativo que tem o seu próprio quadro em uma emissora local. Um dia, ele é escalado para entrevistar Carlton Drake (Riz Ahmed), o criador da Fundação Vida, que por sua vez tem se destacado por conta do seu grande investimento em missões espaciais para encontrar possíveis usos medicinais para a humanidade. Após acessar um documento sigiloso enviado à sua namorada, a advogada Anne Weying (Michelle Williams), Brock descobre que Drake tem feito experimentos científicos em humanos. Ele resolve denunciar esta situação durante a entrevista, o que faz com que seja demitido. Seis meses depois, o ainda desempregado Brock é procurado pela dra. Dora Skirth (Jenny Slate) com uma denúncia: Drake estaria usando simbiontes alienígenas em testes com humanos, muitos deles mortos como cobaias, ao entrar no laboratório, Eddie é atacado e acaba sendo infectado por um simbionte e juntos terão que se ajudar um ao outro enquanto enfrentam uma série de inimigos. O início do filme possui um clima soturno, sério e dramático, bem próximo ao tipo de entretenimento adulto – inclusive nos deixando com a impressão de estar assistindo a um suspense.
A primeira cena que abre o longa é digna de uma produção de terror, por exemplo. Aliás, não sentimos muito a falta de uma censura mais alta, já que o protagonista não desvia de suas marcas mais notórias: sair arrancando cabeças à base de mordidas. Tudo bem que não vemos exatamente os dentes cravando na carne, sangue ou qualquer detalhe dessa visceral decapitação. Mas entendemos o gesto. Ainda assim, são algumas perfurações torácicas, possessões e cenas tensas envolvendo os experimentos da maligna corporação Vida com as criaturas interplanetárias.
A partir do momento que Eddie entra em contato com Venom, o filme se transforma e abraça um teor insano, de nonsense e humor. Não poderia ser diferente ao lidarmos com tais elementos de fantasia tão exagerados que levá-los a sério seria o desafio maior. A ideia é brincar com os conceitos de “O Médico e o Monstro”, onde a esquizofrenia do personagem principal se torna uma de suas qualidades mais apreciáveis no roteiro, dando muito pano para manga para debates e conflitos internos – entre Brock e a criatura.
É nesse aspecto que Venom tem seu maior potencial. Na relação quase amorosa entre o errático protagonista e seu “parasita”. Por falar no simbionte, a tal criatura e suas ideias ganham um certo aprofundamento não imaginado. Um desenvolvimento inesperado, que serve para humanizar este ser e mostrar um lado dele que jamais imaginaríamos ver e pra o publico casual, entreter bastante. Algo muito ausente no cinema de monstro na atualidade, nos quais as criaturas são simplesmente máquinas de matar sem nenhum objetivo. Aqui não, Venom tem consciência, mesmo que em grande parte do tempo deseje apenas “almoçar” humanos, a entidade dá até mesmo dicas de romance para Brock, acredite, é de rachar de rir!
Contudo nem tudo são flores, o roteiro é raso e simplesmente se utiliza de soluções facéis pra variar coisas (dignas do famoso “Martha”) e em outras atropela sem se importar com as consequências. A edição tem seus problemas, sendo visíveis vários erros de continuidade e cortes bruscos, o que demostra possível dedo do estúdio nas decisões.
Os efeitos visuais estão bem conciso, Venom e Riot movem-se duma maneira assustadoramente divertida e bastante fiel ao material adaptado. Venom é fluido mas pesado, os seus tentáculos e o seu corpo emitem aquela percepção de viscosidade necessária, as instâncias em que vemos Brock a transformar-se em Venom e vice versa são soberbas. Infelizmente há algumas cenas menos bem conseguidas, como quando o Venom falar com Eddie pra fora.
Riot, visualmente falando, deixa um pouco a desejar. Acredito tratar-se da sua coloração, mas o simbionte prateado que vemos no final ou é liquido ou é sólido, a meu ver não conseguiram atingir o meio-termo certo.
As sequências de ação, estão boas como as de um bom blockbuster, principalmente a primeira perseguição. O clímax deixa um pouco a desejar por abusar em excesso com o CGi.
Tom Hardy mostra o potencial que o filme tem ao encarnar o jornalista Eddie Brook e não é difícil perceber o amor que o ator tem pelo personagem, tendo a melhor performance dentre todos os envolvidos no projeto. O mesmo entrega suas falas cômicas com eficiência, além de mostrar uma boa interação com o simbionte ainda enquanto o mesmo não teve sua presença totalmente apresentada.
Anne Weying é a ex-namorada de Eddie, protagonizada por Michelle Williams. A sua presença no filme se mostra muito maior que nos quadrinhos de onde originou e mostra-nos uma personagem bastante mais forte, em constante conflito com as circunstâncias à volta de Eddie e com um carinho ainda muito forte pelo anti-herói, pena que para peso de uma atriz como Williams seu tempo de tela é bem pequeno para desenvolver-lá com eficaz.
Outro ponto que deve ser destacado aqui é o “vilão” do filme, Carlton Drake/Riot – interpretado por Riz Ahmed. A Sony encontra com um problema enfrentado pela Marvel em algumas de suas produções: um vilão sem uma motivação forte o suficiente para apresentar uma grande ameaça ao protagonista,mal explorado com frases clichês atrapalhando o longa.
Por fim, Venom apresenta falhas, porém quando acerta consegue entreter o espectador.Depois de Pantera Negra e sua representatividade,Vingadores: Guerra Infinita e sua escala épica ,é fácil para o público ficar mal-habituado, algo que não ajudou na recepção do segundo Homem-Formiga e que pode bem vir a causar problemas ao longa, que tem uma mensagem muito menos acentuada, onde o principal foco é entreter o publico assim como era os filmes de super-heróis nos anos 90 e 2000. Alias se fosse lançado nessa época, com certeza seria um filme de imensas filas. Seu maior pecado seja não abraçar a loucura de seu personagem, mas isso pode ser remediado em sua continuação.
Obs: Vale lembrar que o longa tem 2 cenas pós-créditos, então aguarde até o final dos créditos para conferi-las.