Lançada a 14 anos, o MCU continua sua jornada de manter o ambicioso universo compartilhado da Marvel Studios. A Fase 4 apesar de trazer ainda momentos épicos, me parece mais uma nova transição para o futuro da franquia. Novos heróis chegando, passagens de bastão dos mais antigos vingadores para uma nova geração, séries na Disney+ ampliando ainda mais seus horizontes e também possibilidades de trazer novos gêneros e inserções a sua tão falada e até “haterizada” formula Marvel. Thor: Amor e Trovão é a prova de a formula do estúdio ainda pode ser bem feita na mão de um diretor que a entende e não tem medo de se arriscar. Se Multiverso da Loucura trouxe o terror ao estúdio, o novo filme é a primeira comédia romântica!
Aqui o diretor parece mais solto que no longa de 2017 e refina seu humor, assim como consegue extrair emoção de forma inesperada em um filme que apresenta menos amarra ao universo, mas focado em sua história.
A trama acompanha Thor numa jornada diferente de tudo que já enfrentou – uma busca pela paz interior, numa espécie de “crise da meia idade”. Ao mesmo tempo que participa de batalhas ao lado dos Guardiões da Galáxia, após se unir ao grupo em Vingadores: Ultimato. Mas sua “aposentadoria” é interrompida por um assassino galáctico conhecido como Gorr (Christian Bale), conhecido como o Carniceiro dos Deuses.
Para combater essa ameaça, Thor terá que convocar um time de seres poderosos. Para começar, temos Rei Valquíria (Tessa Thompson), que está no comando da Nova Asgard. Além disso, chama seu melhor amigo, Korg (Taika Waititi), e a ex-namorada Jane Foster (Natalie Portman), que também está passando pelos seus próprios dramas. Mas a cientista surpreende a todos quando consegue, inexplicavelmente, empunhar o martelo mágico Mjolnir, revelando-se a Poderosa Thor.
Assim como em Thor: Ragnarok, o grande acerto de Amor e Trovão é ter a confiança de que uma história não precisa se levar muito a sério para ser boa, poderosa ou até complexa. Toda pegada galhofa, divertida e leve do longa , esconde uma delicada jornada de cura de personagens em profundo sofrimento.
Thor começa o filme questionando sua trajetória até ali. Afinal de contas, quem é Odinson sem as batalhas que o tornaram famoso? O personagem nunca teve um papel de liderança dentro do MCU e essa sensação de deslocamento acontece dentro e fora das telas. Se a Marvel até pouco tempo não sabia o tom que encaixava no personagem, porque o personagem não ter esses dilemas?
O recontro com Jane Foster e a jornada para enfrentar Gorr fazem o personagem olhar para si mesmo e tentar entender onde se encaixa. Ainda que não explore isso com a profusão que muitos esperam, isso mostra como o MCU cada vez mais adapta seus personagens para seu universo e não necessariamente ser a essência dos quadrinhos.
Essa discussão sobre propósito é retomada com outros personagens como a Valquiria e a Jane Foster e porque não o vilão Gorr. Enquanto o Carniceiro dos Deuses enfrenta suas emoções espalhando escuridão pelo universo, os Deuses do Trovão procuram ter uma atitude mais positiva, cheia de cor, já a personagem da Tessa Thompson se vê dividida entre as responsabilidades atuais como Rei de Nova Asgard, e quem ela costumava ser. Entre uma rápida sucessão de piadas, dos mais variados tipos, existe uma delicada história sobre uma pessoa procurando sentido na vida.
O filme usa como base duas histórias geniais de Jason Aaron — Carniceiro dos Deuses (2012) e A Poderosa Thor (2014). Os dois arcos apesar de não serem tão bem explorados, acabam se complementando já que o diretor sabiamente entendeu os quadrinhos e faz um oposto do que a Poderosa Thor da Jane seria para o Carniceiro dos Deuses.
E Christian Bale, não decepciona. Seu Gorr tem uma presença intimidadora, se esgueirando nas trevas quase como um bicho papão, seus monólogos tem presença como deveria, já que suas palavras tem a mesma imponência que sua espada. Seus momentos de combate acabam não sendo tão incríveis quanto seus diálogos, mas Bale traz toda dramaticidade que o vilão tem mesmo com pouco tempo de tela.
Natalie Portman está radiante, e sua Poderosa Thor é o coração do filme, brilhando em batalhas de modo bastante singelo e se mostrando muito à vontade em meio a verdadeiras divindades. Ela convence muito rapidamente ser digna de estar ali, com um carisma incontestável. E quando ela volta a ser apenas Jane Foster, a diferença é gritante. Natalie consegue capturar a humanidade em cada sutileza das circunstâncias que sua personagem está passando.
Alias talvez aqui fique o grande calcanhar de aquiles do longa: seu ritmo tão intenso! Parece que por querer se manter insanamente frenético, o filme acaba não dando tanto tempo para os momentos dramáticos se fazerem mais emocionais. Por outro pra leveza e comicidade isso se faz bem funcional. Esse é um dos poucos casos que uma duração maior faria melhor para a produção.
Em sua essência, Thor: Amor e Trovão tem todos os elementos característicos do Universo Cinematográfico da Marvel. Há cenas de ação dignas de grandes páginas dos quadrinhos, brincadeiras com os personagens, referências por todos os lados e uma piscadela para os próximos planos do estúdio.
Amor e Trovão não tem pretensão nenhuma de revolucionar o universo cósmico da Marvel. Waititi traz uma história com leveza, diversão , mas com significado, incluindo uma mensagem que vai além de teorias para o futuro nos cinemas e easter-eggs. Aqui fica claro o que o realizador é um dos poucos que entendeu a formula do estúdio e a usou ao seu favor em transmitir sua identidade em cada frame dela.
Pra finalizar, o novo Thor tem romance para os apaixonados, ação para quem ama pancadaria, comédia para quem só quer se divertir, e emoção inesperada que vai pegar o povo de surpresa. E, claro, muito trovão.
*Não se esqueça de ficar até o final para as 2 cenas pós-créditos.