STEREO | Chegamos na era do “eu tenho gostos peculiares, você não entenderia” na indústria musical

Victor Fonseca
4 Min de Leitura

Com “God’s Plan”, o rapper Drake passou 11 semanas no topo da Billboard Hot 100, a principal parada de música norte-americana que não raramente exportava seus hits para o resto do mundo. A título de comparação, no tempo que passou na colocação mais alta da lista, a canção superou marcas de músicas como “Hello” da Adele e “Irreplaceable” da Beyonce, que cravaram 10 semanas de reinado. A pergunta que fica é se você já ouviu falar mais de “God’s Plan” do que dos dois dos maiores hits nos últimos tempos.

Sem nenhum tipo de impacto substancial no Brasil, o rapper Drake está aos poucos dominando o mercado fonográfico nos Estados Unidos sem alcançar o resto do mundo. Nesta semana, o que parecia impossível – tirar “God’s Plan” do primeiro lugar -, foi feito por “Nice For What”, o novo single do próprio Drake que dá continuidade ao trabalho do lançamento anterior e culminará em “Scorpions”, novo álbum do artista.

Quando o Black Eyed Peas fez o mesmo movimento de auto substituição no topo da Hot 100 em 2009, com “Boom Boom Pow” e “I Gotta Feeling”, as músicas foram um sucesso mundial. A mesma situação aconteceu com Justin Bieber quando perdeu o topo de “Sorry” para “Love Yourself” em 2016. Por que a impressão que fica é que “Nice For What” e “God’s Plan” não cumprem o mesmo requisito se comparada a outros sucessos? O que mudou de lá pra cá? O Streaming!

Antes de plataformas como Spotify, Apple Music e afins, o consumo legal de música era intermediado por meio de programas de televisão, compra de CDs para ouvir em casa ou se colocar refém do que tocava na rádio. A rádio, por sua vez, reproduzia o que de mais genérico e coletivo existia para agradar os seus reféns, na maior parte ouvintes desatentos que adoravam um bom refrão que se repetia.

https://www.youtube.com/watch?v=EF1hqg7c-Mg

Foi o surgimento do streaming que mudou o rumo do jogo. Quando o Youtube ascendeu como uma plataforma de música, o mercado fonográfico teve que reconhecer o sucesso viral de músicas impensáveis para as rádios como “What Does The Fox Say?” e “Gangnam Style”. Na era do streaming, não existe essa coisa de “intocável”. Ninguém é de ninguém. Cada um pode fazer sua própria orgia musical em casa com internet, uma conta em qualquer plataforma e as milhões de músicas disponíveis na rede. Se muitos optarem pela mesma música, por mais peculiar e não-radiofônica que ela seja: temos um hit.

Com o processo, faz sucesso a canção que mais agrada vontades individuais dos coletivos. Sai a música chiclete que martelava o refrão para ficar na cabeça do maior número de gente nas rádios e entra o fenômeno musical de hits localizados. Músicas que são memoráveis o suficiente para serem lembradas e executadas “on demand”. Atinge o topo, quem melhor consegue estabelecer reflexo com o indivíduo e sua própria identidade cultural. Não mais a tendência do mercado. É a era dos sucessos hiper localizados, reflexos do gosto de um lugar.

Enquanto os Estados Unidos estão ovacionando Drake por lá, por aqui: foda-se. Quem consegue 200 milhões de visualizações brasileiras em uma semana não é o novo clipe da Beyoncé ou até da Anitta, que investe no modelo de sucesso internacional e radiofônico. Quem faz esse montão de sucesso é o single de estreia da Mc Loma e as Gêmeas Lacração. Chegamos na era “eu tenho gostos peculiares você não entenderia” na indústria da música.

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Estudante de Jornalismo, mas formado em medicina após 14 temporadas de Grey's Anatomy. Viciado em séries e amante do cinema.
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