Quando Ela Desaparecer | Uma obra-prima dentre os suspenses investigativos atuais

Laís Andrade
4 Min de Leitura

“Experimente ir à delegacia de uma grande cidade e perguntar sobre as investigações de desaparecidos. Você provavelmente verá pilhas e pilhas de inquéritos em aberto e policiais exaustos por não terem estrutura nem efetivo suficientes para tantas ocorrências.” E é assim que começamos a história deste thriller policial, com parágrafos curtos de onde saltam constatações firmes sobre essa realidade assustadora. Pessoas comuns, que transitam em lugares comuns, desaparecem sem explicações lógicas e os noticiários borbulham em ponderações vãs sobre os fatos.

A trama gira em torno de Francisca Silveira do Carmo, ou simplesmente Kika, uma garota de 16 anos que desaparece durante um passeio escolar à um sítio. Daí passamos a ler os relatos de pessoas próximas, colegas, detetive, psicólogos. Todos tentando decifrar a vítima e dando-nos peças soltas sobre a motivação para esse crime. Os capítulos se alternam mostrando conversas entre o detetive e a mãe de Kika, Dona Maria João, em um linha temporal mesclada que cria um ritmo instigante na história. Francisca é uma garota que desperta a atenção alheia: vencedora do concurso Miss Guarulhos, dotada de uma beleza ímpar, porém com um comportamento que muitos julgam ofensivo. Após seu desaparecimento é notado que as reações dos colegas de classe tendem sempre ao extremismo, indo do ódio à adoração. Isso fica evidente em comentários como o de uma garota chamada Melina: “Ela mereceu. A roupa dela, da Kika, você viu o tamanho do shortinho? Ela usa o mesmo desde o nono ano do ensino fundamental. Muito vaca.”. Enquanto que outros, como seu colega, Eduardo Ramoña, que nutria um amor platônico devocional à Kika, fica a dizer insistentemente ao delegado “Eu amo ela, eu amo ela.”. Desta forma, os suspeitos são muitos e as pistas escassas.

O autor desenha aqui um cenário envolvente, com personagens controversos que nos fazem questionar várias vezes nossas precipitadas conclusões sobre o caráter alheio com respaldo apenas em levianos preconceitos. Nos confrontamos com temas como pedofilia, religião, abuso sexual, feminismo e tantos outros debates que são naturalmente inflamados quando abrimos a janela midiática destes casos que tanto chocam, e que fazem as opiniões públicas choverem indiscriminadamente, como facas amoladas, não importando quem vão atingir. Uma história forte e bem estruturada, que entretêm do começo ao fim.

O autor, Victor Bonini, é paulista e repórter da TV Globo. Além deste livro, ele publicou outros livros dois, pela editora Faro, que estouraram em críticas positivas; O Casamento e Colega de Quarto. Foi uma agradável surpresa descobrir esse autor, que impressionou pelo domínio da escrita, o tino para suspense e a perfeição como encaminhou cada passo dessa história investigativa.

A obra será adaptada para televisão em formato de série, com 10 episódios. Contará com a participação do autor no roteiro, e será dirigido por Fabrício Bittar (“Os Exterminadores do Além e a Loira do Banheiro” e “Como se tornar o pior aluno da escola”). Ainda não há previsão de estréia.

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Estudante de Letras nas horas vagas. Apaixonada por livros. Marvel é melhor que DC.
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