Sabemos que não é fácil criar um mundo para o gênero fantasia, ainda mais quando se é destinado ao público adulto. Tantos detalhes com certeza dariam um livro só de apresentação de cada canto que na história poderá passar despercebido. Por essa razão os fãs de “A Saga do Assassino” devem agradecer a Robin Hobb por trazer em “O Navio Arcano” mais da ambientação que lhe trouxe a esta nova trilogia. E que lugar seria mais curioso do que o vasto mar de O Reino dos Antigos? Aqui começa uma nova fase para quem já leu a trilogia anterior, mas já avisamos que essas aventuras marítimas podem ser desfrutadas por quem começou agora por “O Navio Arcano”, primeiro livro da série “Os Mercadores de Navios-Vivos”.
Originalmente publicado em 1998, o aguardado lançamento chega pela editora LeYa em parceria com o grupo Omelete, que já prometeram as sequências “O Navio Insano” e “O Navio do destino”, até mesmo por prestigiar grandes escritores de literatura fantástica. Mas o que diferencia essa história das demais? Simples, os Navios-Vivos! Por serem feitos de madeira arcana, essa que é dotada de consciência, eles são tão raros quanto o material que compõe sua estrutura, que só poderá ser encontrada nos Ermos Chuvosos. Com uma vasta mitologia ao redor dessas embarcações, não é difícil imaginar e navegar nessa história, mas existe dificuldades em possuir um Navio-Vivo. Para tal feito é necessário que três gerações da mesma família morram em seu convés.
O que antes não foi prioridade para a autora agora recebeu uma mudança significativa. Por nos mantermos em navios a maior parte da história seremos incentivados a conhecer cada canto dos 7 mares. Com a participação de muitos personagens todos serão diferenciados e desenvolvidos com primor. A família Vestrit é um dos núcleos principais, pois o capitão Ephron está muito doente, e sua filha Althea vive um dilema, pois ainda que fique preocupada com o pai, sabe que sua morte significará para sua família a posse do Navio-Vivo Vivácia que despertará, sendo Althea sua capitã. Para seu descontentamento, a jovem terá problemas com seu cunhado Kyle Porto que também deseja essa posição de poder, uma vez que é casado com a irmã mais velha de Althea, Keffria. Esses conflitos familiares colocarão mais percalços no horizonte de nossa Althea, que tem bravura e merece conquista-lo.
Destaca-se entre os personagens os filhos de Keffria e Kyle, que prometem dar as nuances necessárias para a evolução da trama. Wintrow é o irmão mais velho e o que mais terá desenvolvimento nesse volume, seguido por Malta, a irmã do meio que tanto se assemelha ao pai quando se trata de suas ambições. Outro que mostrará a variedade do núcleo que antes se resumia a família Vestrit é o pirata Kennit, cuja família tem o Navio-Vivo Paragon. Com Althea desaparecida, terá ela a força pra recuperar Vivácia? A resposta para essa pergunta é fundamentado na força que veremos a jovem adquirir ao longo da leitura, que chega a ser dinâmica demais para um total de 864 páginas. Com temas que vão de dificuldades financeiras e machismo até a dor do luto, mistérios e magia além da compreensão de meros mortais, existirá facilidade de entender a motivação de cada um, pois pessoas são assim.
Para um começo a edição pode assustar, mas é entretenimento garantido por dias, e por se dividir em capítulos longos é um investimento que exige do leitor pausas pontuais após cada capítulo. Descansar é o que facilita a imaginação de fluir livremente e de captar tudo em seu melhor momento. Para os fãs de “As Crônicas de Gelo e Fogo” de George R. R. Martin e “A Sombra do Corvo” de Anthony Ryan, será possível que essa saga alcance suas expectativas de leitura. A arte da capa ficou por conta do talentoso ilustrador francês Marc Simonetti, que trouxe sua arte apenas para a edição brasileira de “O Navio Arcano”, assim como as que fez para outros lançamentos da editora.
A conclusão é cheia de revelações pesadas, e teremos momentos para lamentar as perdas que virão. Robin Hobb soube criar um apoio para sua saga mais popular, e nem por isso essa deixa de ser superior. O pseudônimo da autora que na verdade se chama Megan Lindholm foi uma ideia de usar o nome ‘Robin’, que é facilmente usado para homens ou mulheres e ‘Hobb’ por lembrar o termo “Hobbit”, o que pode parecer bobo mas repercute de maneira voraz nas vendas (ainda mais na época em que foi publicado). Sua escrita se mostra indiscutivelmente intensa e cheia de significados para ligarmos essa fantasia com o nosso mundo. Por fim, “O Navio Arcano” se supera e se torna uma das leituras mais ‘Vivas’ que poderíamos esperar em 2017, mostrando também um excelente trabalho da equipe LeYa ao traduzir com afinco. Aguardaremos “O Navio Insano” com mais paixão ainda.