O primeiro Matrix lançado em 1999 é um dos marcos da historia do cinema e da cultura pop. Escrito e dirigidos pelas Irmãs Wachowski o longa trouxe uma ficção cientifica complexa que abordava questões existencialistas e filosóficas de maneira inteligente e questionadora, além de trazer cenas de ação impressionantes e efeitos visuais de revolucionaram o cinema desde de então.
Se não fosse por Matrix esse que vos fala aqui não teria o cinema como uma das suas maiores paixões. Uma obra sem igual. Em 2003 o longa ganharia suas continuações Reloaded e Revolutions que apesar da segunda parte expandir e trazer diálogos incríveis, acabaram não ficando tão memorável quanto o seu original.
Depois de 18 anos após o fim da saga, eis que Lana Wachowski (sua irmã Lily decidiu não participar dessa vez) “ressuscita” a franquia trazendo Neo, Trinity e cia de volta para nova conexão a Matrix com Resurrections. A espera valeu a pena? Bom, como fã da franquia posso dizer que sim.
Para tentar não entrar no campo do spoiler e manter a trama em segredo para cada um adentrar, explicarei a história de forma muito breve: em Resurrections, Neo está de volta à Matrix, vivendo uma falsa realidade. Ele não tem conhecimento sobre os eventos dos filmes anteriores. Mas claro, não demora para o protagonista ser confrontado com a decisão de rasgar o véu ilusório e descobrir a verdadeira essência de sua rotina.
Se utilizando da nostalgia o primeiro terço de Resurrections até lembra O Novo Pesadelo de Wes Craven, pela semelhança de algumas coisas da trama deste assim como a metalinguagem que é inserida. O roteiro explora a sensação de estranhamento que acompanhada do déjà vu pode até soar repetitiva em alguns momentos, mas isso não atrapalha a dinâmica das cenas. Pelo contrário: elas se tornam necessárias para reafirmar a nostalgia presente no enredo. É aqui que a montagem do filme age com maestria, tornando-se um aspecto fundamental para dar ao telespectador a sensação de verossimilhança e, claro, déjà vu.
Há dentro das entrelinhas do roteiro uma própria crítica ao uso dessa nostalgia(com o próprio filme e até a Warner) assim como a indústria em recriar as mesmas histórias incansavelmente (“pra quer rescrever um código antigo para fazer algo novo? diz um personagem no longa”) e até como o publico reage e consome ao que são feito, algo que a diretora e seus roteiristas conduzem muito bem e dar um ar sarcástico e até irônico a produção. Não quero adentrar para cair na zona dos spoilers, mas o longa não deixa de refletir sobre a nossa própria sociedade, assim como os filmes antecessores também propõem e como as inovações e artifícios invasivos que nos tornam cada vez mais reféns de nós mesmos e fazendo como um personagem revela, o controle ainda mais perfeito, afinal porque ficar no real se o virtual é muito mais sedutor?
A questão da escolha, que sempre foi abordada na franquia aqui ganha novos contornos. Não importa se você toma a pílula vermelha ou azul, não importa o que você decidir: a partir do momento em que há apenas dois caminhos, a liberdade nunca será integral, já que ambos os percursos delimitam seus próximos passos. Analisando friamente, isso nos lembra a emblemática cena de Revolutions em que o agente Smith fala para Neo porque ele está lutando e ele retruca com: “Eu escolhi persistir” reflete na base para a criação do novo capitulo da saga por Lana, a perda dos pais. Se fizemos um novo paralelo até a conversa com Merovingian (Lambert Wilson) em Reloaded sobre o a falsa ilusão da escolha em decorrência do proposito se encaixa e mostra como essa questão como eu disse acima está sempre presente na saga. O proposito humano em continuar vivendo, mesmo diante do destino iminente da morte. Ora, se conhecemos o final da nossa jornada, por que continuamos? Simples: nós escolhemos. Mas, se nós não sabemos o que é real, como vamos resistir? Aí está outro questionamento levantado na trama.
Claro que nem tudo é perfeito o ritmo arrastado às vezes quebra a empolgação construída com tanto cuidado pela diretora e um pouco de barriga devido ao seus longos 148 minutos (2 horas e 28 min) fazem essa sensação ser sentida.
A ação revolucionaria da franquia aqui se torna um tanto mais intimista, não espere ver algo tão marcante quanto os anteriores e isso pode causar um tanto de decepção em alguns, mas sim há boas e inventivas cenas (como a intensa do terceiro ato) no longa. As lutas aqui estão mais viscerais e com menos piruetas de antes, mas sim, Neo ainda sabe kung fu!
A volta de Keanu Reeves e Carrie Anne Moss depois de décadas aos seus personagens é outro ponto alto da produção. A química dos dois é instantânea desde do primeiro momento. Mesmo poderoso o Neo do Reeves aqui é um personagem mais vulnerável, assim como a Trinity de Moss que tem uma importância ainda maior aqui que anteriormente.
As novas adições ao elenco como a Bugs (Jessica Henwick) trazem ares novos ao filme. Henwick que ainda se destaca bastante nas cenas de ação. Mesmo com as ausências de Laurence Fishburne e Hugo Weavin como Morpheus e Smith, respectivamente suas novas versões agora vividas Yahya Abdul-Mateen II e Jonathan Grouff transbordam carisma e em nenhum momento tentam recriar seus interpretes do passado. Já Neil Patrick Harris apesar de expositivo, conferem um personagem intrigante de se ver.
Matrix Resurrections no final é o exemplo perfeito de revitalizar e expandir uma franquia tão revolucionária na história do cinema. Terá um fator divisivo bem grande, sendo forte o ame ou odeie, mas mesmo assim o longa entrega de forma muito interessante uma deliciosa história que soa familiar, original e incontestavelmente sensível e intimista juntamente com questões existenciais que são debatidas e re-debatidas.
Ps: Há uma cena depois dos créditos