Produzida pela Plan B de Brad Pitt e pela Anonymous Content, responsável por The Knick, True Detective e Mr. Robot, dentre outras, The OA entrou na grade de conteúdo original do Netflix sem nenhum alarde. Em sua terceira grande colaboração (depois de O Sistema e A Seita Misteriosa), a dupla Brit Marling (que produz, escreve e estrela a série) e Zal Batmanglij levam essa ideia discreta e minimalista para Netflix em uma trama que promete ficção científica com elementos sobrenaturais. Em The OA, adolescentes e adultos que estavam perdidos acreditam ter encontrado sua rota na misteriosa Prairie (Marling), a garota cega que desapareceu e retornou inesperadamente com a visão recuperada. Qual seria o segredo desse milagre?
E, de repente, com isso, nós, espectadores, passamos a ser também querer encontrar nossa rota nessa estranha mulher loira com terríveis marcas nas costas e um passado que só vai ficando mais estranho na medida em que a temporada progride. Prairie pede a seus cinco discípulos – Steve Winchell (Patrick Gibson), traficante de drogas e bully da escola local, Alfonso “French” Sosa (Brandon Perea), um garoto que luta para cuidar da mãe e ao mesmo tempo destacar-se nos estudos, Buck Vu (Ian Alexander), um menino transgênero, Jesse (Brendan Meyer), um jovem sem perspectivas e BBA (Phyllis Smith), uma professora que acabara de perder o irmão gêmeo – que acreditem piamente nela e nós temos que seguir esse mesmo caminho. Mas, como eles, não temos como deixar de duvidar do que ouvimos e vemos em flashbacks orgânicos que passam a ocupar grande parte de todos os sete episódios seguintes. E essa dúvida também é importante no jogo de cena criado constantemente por Batmanglij ao colocar em oposição o vilarejo semi-abandonado onde todos vivem e o quase surreal local onde a moça viveu os últimos sete anos.
Essa característica pode afastar potenciais espectadores que não tiverem paciência para deixarem-se envolver por essa série que quer nos fazer pensar em questões filosófico-transcendentais, levando-nos pela mão por caminhos misteriosos que misturam de forma homogênea ficção científica, fantasia, espiritismo, mistério e um senso de admiração e de contemplação que de certa forma emula, ainda que de maneira mais tangencial e menos ambiciosa o que Sense8 conseguiu alcançar de outra maneira. Portanto, o verdadeiro teste que o espectador terá ao começar a navegar pelos mistérios envolvendo Prairie Johnson é parar para respirar e tentar acompanhar o ritmo lento e o desenvolvimento estranho – diria até bizarro – desta primeira temporada. Os ganchos asseguram a passagem de um capítulo para o outro e a beleza estética prende o olhar, E sim, chega um ponto em que a narrativa perde um pouco seu passo e há uma repetição temática que pode cansar. Mas, como isso acontece lá pela metade, é de se supor que quem chegou até esse ponto estará engajado o suficiente no conto de Prairie para continuar e, novamente, somos brindados com uma espécie de reviravolta que essa sim nos testa (e testa os discípulos) de verdade. Não abordarei a questão especificamente aqui para evitar spoilers, mas basta dizer que não é algo fácil de ver sem desprender-se da imersão narrativa e soltar algumas risadas aqui e ali. É estranho. É inusitado. É extravagante. É até ilógico e ridículo. Mas ninguém pode dizer que não é interessante. E, se o espectador comprar – mesmo duvidando de Prairie – então a série terá funcionado de verdade.
O design de produção é bem estruturado na proposta da série, e sua fotografia no presente da história é opressiva, com uma paleta de cores básica, com branco, cinza e preto e uma direção fechada no rosto ou no tronco dos personagens passando uma sensação cada vez maior de opressão e claustrofobia, algo que reflete muito bem aquilo que vemos em flashback, mas que é a realidade de todos ali do círculo de relações de Prairie.
The OA é uma série que desafia o espectador e não por ser particularmente complexa, mas sim por tentar o inusitado,o estranho, o que verdadeiramente não se espera do ponto de vista técnico e dramático. E, por isso com certeza ela não agradará todo mundo, mas garanto que surpreenderá muita gente.