“Get out”, essa expressão da língua inglesa, título do novo filme escrito e dirigido pelo ator e comediante Jordan Peele, traz significados ambíguos, pode ser tanto um pedido para se retirar ou uma interjeição para salvar-se. No Brasil, os distribuidores escolheram a segunda opção e foi assim que o título desse filme se tornou “Corra”, perdendo a oportunidade de um título igualmente ambíguo, como “Dê o fora”. E é essa ordem para se retirar, essa expressão, clara e concisa do quanto alguém não é bem vindo em um lugar que irá correr durante todos os minutos do que alguns críticos estão chamando de ‘terror racial’.
O filme começa intenso, mesclando o suspense com a uma sutil sugestão ao espectador. Depois acompanhamos as expectativas do jovem Chirs (Daniel Kaluuya) ao ir visitar os pais brancos de sua namorada igualmente branca, Rose (Alissson Willians) e todas as situações bem estranhas que isso leva. É interessante notar como é tratado o relacionamento entre negros e brancos, além de quão constrangedor ainda é se falar sobre esse assunto até que aconteça com a pessoa em questão.
A crítica construída é muito sagaz. ‘Get Out’ é uma metáfora perfeita do começo ao fim. Seus diálogos estão plenos de significados para além das próprias palavras. O cenário e a fotografia do filme, igualmente, principalmente os tons sérios amadeirados claros, que se mesclam às roupas dos personagens em um efeito sépia e carregam simbolismos. Nas cenas externas, é a fotografia que dá o tom psicológico do momento, acompanhado ao ritmo do filme, enfoques de câmera centralizando o rosto dos personagens, para captar ao máximo suas emoções em algumas cenas. Algumas interpretações são propositalmente teatrais, cheias de trejeitos e uma dose de exagero, mas estão perfeitamente encaixadas à proposta.
Mas o que se destaca no filme é a sua parte cômica, que balanceia toda a tensão e carrega a crítica agora para o lado do humor. Jordan Peele não larga a sua veia cômica e traz isso pra um filme forte, pesado e de tensões reais no cotidiano e não apenas para a ficção com maestria, auto conhecimento e precisão cirúrgica. Essa parte pode ser melhor apreciada nas sessões legendadas, pois é notório mesmo para os não falantes da língua inglesa a diferença quando em tela a língua muda do inglês standart padrão para o fenômeno conhecido como Black english, uma forma peculiar e própria dos afro-americanos se comunicarem.
O desfecho da crítica, da metáfora e consequentemente do filme é muito inteligente e mostra o principal diferencial do filme que o destaca tanto: ele não se prende a clichês. É impressionante ver como diálogos sobre a moral, sobre o racismo (diálogos muitas vezes velados) e a condição do negro na sociedade estadunidense encerra objetiva e metaforicamente a crítica do discurso de ‘Get Out’.