Muitos falam sobre o trabalho de Neil Gaiman, lembrando de “Sandman” principalmente, e esquecendo que um autor pode fazer muito mais por seus leitores. Um exemplo disso é o livro “Deuses Americanos”, lançado originalmente em 2001, sendo relançada em uma “edição favorita do autor”, onde o mesmo aconteceu com o livro “Lugar Nenhum”, o primeiro romance de Neil Gaiman, publicado em 1997. Ambos lançados em 2016 pela Intrínseca. Se você gosta de uma aventura psicológica, com um teor investigativo… esse é o livro!
Em uma caricatura da realidade americana (e mundial), vemos Shadow protagonizando essa desventura repleta de sarcasmo e nenhuma compaixão com a sequência de acontecimentos, pois ele acaba de sair da prisão e perder sua esposa. Dividido em 4 partes (a última é o epílogo) entenderemos o surgimento de novos deuses e veremos o conflito com alguns deuses antigos, todos em busca da sobrevivência. A cultura é um forte tema envolvido nessa obra, não se resumindo apenas a americana, já que até essa deriva de outras e essa combinação tornará a leitura menos convencional.
A criação dos personagens é adequada, sendo que, mesmo no papel secundário, muitos poderão ser atraentes. O que falta no protagonista apático e abatido, sobra nos demais personagens, sendo algo intencional e provocante. Como se os demais manipulassem Shadow (que até então é um mero espectador) e fizessem a história como bem quisessem. Recheado de reviravoltas, será difícil não continuar lendo tudo que se segue nas páginas. Vale acentuar que ele possui muitas referências a outros livros e programas de TV, a exemplo de “O Pequeno Príncipe”.
Gaiman possui uma forma bastante peculiar de escrever, seu mundo fantasioso é real a tal ponto que ele consegue passar em palavras a imagem em nossa mente. Seja nos sonhos, ou na realidade, esse é um livro de fantasia com pitadas de críticas sociais e culturais, e lembra bastante um roteiro de HQ, algo que o autor se interessa. Talvez seja a sua obra mais difícil em questão de leitura, podendo ser pra alguns uma verdadeira bagunça. Só que esse é o toque de Gaiman… seu livro é estranho por natureza. Os deuses aqui presentes, estão mais humanizados do que nunca, pois sofrem e são vulnerabilizados, como qualquer um pode ser. Já Shadow possui uma forte relação com todas as situações apresentadas e por isso chegará ao seu limite.
Na “edição preferida do autor” haverá extras dignos de fã, contendo um posfácio, apêndice e uma entrevista com o autor (realizada em 2005) onde vemos com mais clareza o que representa o livro para o autor, ambientações reais na obra e sua impressão sobre sua fama e etc. Por fim, mas não menos importante, uma nota do tradutor será encontrada explicando sobre a difícil jornada de traduzir, tendo um motivo real para escrever a respeito, já que muitos criticam a tradução que parece “ser outro livro” em questão da obra em sua escrita original. Bem pertinente!
Fica claro que esse não é o melhor livro de Gaiman, mas não deixa de nos fazer imaginar e se sentir na pele de cada personagem favorito que encontremos. Com um pouco de sexualidade é possível atrair o público que busca algo a mais que não seja apenas “fantasia”. Está claro que este é um romance adulto, não devendo ficar em prateleiras de fácil alcance para as crianças, pois esses não são os deuses que elas viram em “Percy Jackson”.