Atualmente diversos filmes optam por entregar uma história simples, muitas vezes rasa, que em geral não necessitam de grandes raciocínios do público para entendê-los. No entanto para quem gosta de exercitar a mente, o interessante é alinhar entretenimento e o saber e é exatamente isso que O Contador proporciona para a plateia. Estruturando um bom jogo de quebra cabeça para mostrar os segredos do seu protagonista,o filme se mostra uma eficiente mistura de gêneros.
A trama nos apresenta ao misterioso contador Christian Wolff (Ben Affleck), portador da síndrome de Asperger, e um matemático brilhante e capaz de resolver qualquer problema de lógica posto à sua frente. Quando seus serviços são requisitados para a auditoria de uma empresa de robótica, seu trabalho encontra mais podres do que o esperado e sua cabeça torna-se cobiçada pelos próprios empregadores; ao mesmo tempo em que um agente do Tesouro (J.K. Simmons) inicia uma caçada por ele. O que ninguém espera, é que Christian balanceia sua vida dupla de contador com a de assassino profissional e internacional.
O roteiro de Bill Dubuque (O Juiz) é bem sofisticado e não entrega nada facilmente, ele “força” a plateia a se manter completamente imersa na trama para conseguir acompanhar todo o enredo. É uma trama enxuta e eficiente em sua proposta, servindo como um thriller de finanças que lentamente vai se transformando em um estudo de personagem e um filme de ação desenfreado. Quase uma cria entre Rain Man, Wall Street e John Wick, se é que é possível uma mistura tão inusitada de fato ocorrer.
Porém, em alguns momentos da narrativa, o longa parece um tanto perdido quanto às ações e reações da trama central, especialmente no que diz respeito à “linguagem de Wall Street” e os eventos que iniciam a série de matanças promovidas pelo assassino vivido por Jon Bernthal. Essa temática também exige uma série de exposição que torna-se carregada e nada natural para os diálogos mais introdutórios, como a própria apresentação de Bernthal – o que deveria ser uma cena ameaçadora, torna-se uma maçante introdução à macroeconomia.
Ainda sim, toda a ação ocorre de forma rápida e roteiro rejeita monólogos desnecessários. Volta e meia, o filme recorre a flashbacks da infância de Wolff sem tornar esse recurso maçante – como acontece em tantos outros filmes.A direção de Gavin O’Connor (Guerreiro),também está eficiente e sabe acompanhar a sutileza da narrativa, já que muito é revelado sem falas diretas, ou seja, conseguimos compreender muitas coisas somente com as lenta inteligente do diretor, basta como já foi citado usar o cérebro durante a projeção.
Ben Affleck está incrível no papel do Wolff, um personagem difícil que alterna diversos tons cênicos e ele consegue achar o timing certo de cada um deles, inclusive num princípio de sentimento amoroso por Anna Kendrick que para o personagem era inédito, e isso é muito bem realizado na trama. O elenco de apoio é todo muito bem aproveitado, ainda que Anna Kendrick fique presa ao mesmo estereótipo que tem se concentrado em fazer e que a ótima performance de Jon Bernthal traga uma reviravolta tola e completamente previsível envolvendo seu personagem. O longa também peca um pouco em abandonar os personagens de J.K Simmons e Addai-Robinson, que só voltam a aparecer perto da conclusão do filme, e mostram potencial desde o começo e poderiam ser mais bem explorados.
No geral, O Contador acerta muito mais que erra. É um cruzamento interessante entre um thriller de espionagem e um filme de finanças, contando com um elenco eficiente e uma direção intensa do competente Gavin O’Connor. Pode se perder aqui e ali no miolo da história, mas é um bom entretenimento.