Despontando de forma impressionante em 2015, o diretor Robert Eggers trouxe com A Bruxa e seu trabalho seguinte O Farol, uma assinatura própria no gênero do terror em duas obras bastante aclamadas. Para seu novo projeto, Eggers resolveu se desafiar como cineasta e apostou em algo fora da sua zona de conforto e embarcando em um épico ousado e visceral que é O Homem do Norte, longa que traz a clássica lenda de vingança de Amleth ( que inspirou a famosa peça Hamlet de William Shakespeare) além da ambição de se tornar o mais preciso filme sobre a cultura viking da atualidade.
A trama do longa segue a história de vingança e loucura de um príncipe. Se passando no ápice da Landnámsöld, no ano de 914, o príncipe Amleth (Oscar Novak) está prestes atingir maioridade e ocupar o espaço de seu pai, o rei Horvendill (Ethan Hawke), que acaba sendo brutalmente assassinado. Amelth acaba descobrindo que seu tio é o culpado, mas ainda sequestra a mãe de Amleth primeiro, a rainha Gudrún (Nicole Kidman). O menino então jura que um dia voltaria para vingar seu pai e matar seu tio.
Vinte anos depois, agora Amleth crescido (Alexander Skarsgård), um homem viking que sobrevive ao saquear aldeias eslavas, conhece uma vidente. Ela por sua vez o lembra que chegou a hora de cumprir a promessa que fez há muito tempo atrás: salvar sua mãe, matar o tio e vingar o pai. Ele então parte para uma odisseia em busca do tio para finalmente concluir sua jornada de vingança.
O roteiro escrito por Robert Eggers e Sjón (e também realizou o de Lamb) como dito acima se baseia na lenda de Amleth, escrita pelo historiador dinamarquês Saxo Grammaticus, que traz em destaque a clássica história de vingança e o drama familiar característicos dos típicos textos nórdicos antigos. Por outro lado a adaptação aqui proposta por Eggers, busca o tempo todo questionar a noção de que contos de vingança giram em torno de uma ideia reducionista de que violência justificada é a única saída, através de dúvidas, contradições e alternativas para seu torturado protagonista.
A vingança ainda que seja o ponto de partida para o filme desenvolver sua trama, vários outros temas como guerra, poder, sexo, destino e fé se misturam e são abordados e debatidas enquanto Amleth se prepara para a retaliação que prometeu ao pai, o rei Aurvandil.
Mesmo tendo uma grande produção bancada por um estúdio, Eggers consegue imprimir sua identidade e assinatura usando bem esse orçamento para recriar um passado histórico viking de maneira autêntica, ambiciosa e visceral. Como em seus trabalhos anteriores, aqui a precisão histórica continua sendo minuciosa e chega um outro nível em relação ao trabalho de pesquisa e fidelidade histórica. A historia brutal flertar com o misticismo da mitologia nórdica inserida através das clássicas simbologia que o cineasta costuma colocar em seus filmes, como de forma explicita no roteiro.
Mesmo assim tenho que reforçar que como outros trabalhos do realizador, não espere um épico de ação incessante como muitos blockbuster que vemos, aqui apesar das cenas de ação brutais que em muitas vezes são filmadas em plano-sequência, o que exige um forte trabalho de coreografia, a progressão e o desenvolvimento da história é lenta, onde se prevalece a ambientação rica em detalhes e, claro, intimista e opressora – mas sem deixar de lado as cenas impactantes e brutais de combates.
E por sinal, reforçando acima, essas cenas mostram a evolução do cineasta, que apesar de nunca ter realizado alguma nesse nível anteriormente, consegue elaborara-las muito bem a ponto de sentimos o impacto de cada golpe.
A direção de fotografia de Jarin Blaschke, que trabalhou com Eggers em seus dois filmes anteriores, e se destaca pela composição de ambientes naturais e intimidadores que juntamente com a precisão histórica do roteiro e de seu realizador ajuda e consegue prender o público com o desconforto.
Alexander Skarsgard consegue passar perfeitamente o sentimento de ódio internalizado pelo personagem por causa dos acontecimentos de sua infância que o colocam em sua jornada vingativa, assim como a fisicalidade que externaliza esses seus desejos violentos e se mostra necessária para as cenas de ação intensas da produção. Junto com ele também temos grandes performances de Anya Taylor-Joy, Nicole Kidman e Claes Bang.
O Homem do Norte é o projeto mais ambicioso de Robert Eggers e uma evolução natural como cineasta trazendo sua visão e estilo autoral para recriar de forma épica e brutal uma história de vingança e brutalidade que flerta com o misticismo. Se possível, assista essa visceral jornada criada por Eggers nos cinemas.