Green Book – O Guia abusa de clichês, mas reúne boas atuações

Carol Magalhães
4 Min de Leitura

Indicado ao Oscar de Melhor Filme, Green Book – O Guia cumpre com muitos dos clichês que esperamos em “filmes de premiação”: atores renomados, ok. História dramática, ok. Abordagem de problemas sociais, ok. Diálogos emocionados, ok. Mas o filme, dirigido por Peter Farrelly, consegue, através do carisma dos dois personagens principais e de um ótimo senso de humor, fugir de ser um filme sisudo ou cult demais.

Green Book conta a história de dois homens – Dr. Shirley (Mahershala Ali), um pianista negro no auge de sua carreira e Tony “Lip” (Viggo Mortensen), um “pé-rapado” descendente de italianos – que abarcam numa viagem pelo sul dos Estados Unidos. É aí, talvez, que o filme comete um dos seus poucos erros (ou acerto?): em uma cena do início do filme, é possível ver como Tony vive e faz parte de uma comunidade bastante racista. Mas, logo após ser contratado como motorista do artista, o racismo escancarado recede e dá lugar àquilo que é o real foco do filme: o racismo velado, sutil, às vezes só perceptível para quem o sofre na pele.

É claro que é difícil falar em racismo velado no contexto em que se situa o filme, mas, mesmo com algumas cenas pesadas de agressão e abusos policiais, Green Book escolhe dar mais atenção à sutileza – principalmente na relação entre os dois protagonistas, já que o italiano não consegue, à primeira vista, reconhecer Dr. Shirley como uma pessoa que vai além dos esteriótipos associados aos negros americanos na época.

Mahershala Ali, Dimiter D. Marinov, and Mike Hatton in Green Book (2018)

E é neste ponto em que podemos considerar que a mudança seja, na realidade, intencional e bem usada. Parece que uma das intenções do filme é mostrar que os preconceitos da sociedade podem se inserir em nós mesmos sem os notarmos; e que bastaria sair da zona de conforto e entrar em contato com outras pessoas para percebemos que, ao final, podemos estar apenas repetindo o que nos foi ensinado toda a vida.

A amizade entre os dois protagonistas é, obviamente, o ponto alto do filme. Com duas personalidades opostas, os dois homens têm uma ótima química não só entre si, mas em relação a outros personagens (como com a mulher de Tony) e criam diversos momentos engraçados durante a história. O drama e a tensão ficam resguardados para algumas poucas cenas, e mesmo assim são facilmente deixados de lado.
Faz falta uma atenção mais especial à história pessoal do personagem de Mahershala Ali. Mesmo com a intenção de demonstrar que, por não ser nem  um “branco típico” nem um “negro típico”, o pianista vive isolado em sua genialidade, o próprio filme faz referência a uma ex-mulher que não ganha mais do que duas frases no desenvolvimento do personagem. A relação de Dr. Shirley com sua mãe, que foi quem lhe ensinou a tocar piano, também poderia ter sido melhor aproveitada para ajudar a entender o que construiu a personalidade rígida e fria do protagonista.
Viggo Mortensen and Mahershala Ali in Green Book (2018)
Ao final, chamam atenção também as cenas dos shows, que trazem não só um respiro ao filme, como um espetáculo musical à parte. Mas o tópico principal, é claro, continua sendo a história de uma improvável amizade – cabe ao espectador decidir se essa mensagem final traz esperança e reflexão ou não passa de um clichê ingênuo de cinema.
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Caroline Magalhães é estudante de jornalismo, blogueira e leitora ávida. Vira fã das coisas em segundos e tem milhões de crushs que moram em livros, séries ou filmes. No Cinesia, escreve sobre histórias do mundo nerd.
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