Samantha! | Uma temporada inconsistente, porém divertida

Renato Rodrigues
6 Min de Leitura

Quem gosta de ver (e maratonar) séries sabe que quando se trata de audiovisual as primeiras impressões não são necessariamente as que ficam. Um plot twist bem utilizado no final de uma temporada pode dar novo fôlego e elevar a qualidade de uma série, como aconteceu com The Good Place, por exemplo. Mas o que acontece com Samantha! é o contrário: um par de episódios não tão bons no fim da temporada acaba por diminuir o brilho de uma série que poderia ser excelente.

Divulgação / Netflix

Mas espero que a primeira impressão do leitor sobre o parágrafo acima não o impeça de assistir aos sete episódios da temporada. Samantha! tem vários méritos, começando pelo fato de apresentar temáticas e referências bem brasileiras. É muito legal ver que a Netflix vem produzindo cada vez mais séries nacionais, e eu, como brasileiro, sempre incentivo meus compatriotas a darem ao menos uma chance para as séries feitas aqui.

Emanuelle Araújo dá vida à personagem-título, uma ex-celebridade mirim dos anos 80 que busca voltar ao estrelato de qualquer maneira. Para quem viveu a década de 80, a série é um prato cheio. As referências são muitas e vão além da nostalgia, criando um viés crítico sobre aquela época e que se estende à indústria do entretenimento dos dias de hoje. Se antes tínhamos crianças fazendo propaganda de cerveja e mascotes em formato de maço de cigarros, por exemplo, hoje temos a busca inescrupulosa por likes nas redes sociais e reality shows que nada tem de realidade.

Divulgação / Netflix

O elenco é outro ponto alto da série. Além do ótimo trabalho de Emanuelle, o ex-marido e os filhos de Samantha (interpretados por Douglas Silva, Cauã Gonçalves e Sabrina Nonata) formam um núcleo familiar que funciona muito bem junto e tem alguns dos melhores diálogos da série. De vez em quando o texto força uma fala ou uma piada que acaba soando engessada, principalmente na boca das crianças, mas isso é mais problema do roteiro do que da atuação. Outro destaque é Daniel Furlan, como o agente Marcinho. Se você não esteve na Terra no último ano e não conhece o trabalho dele, faça isso agora. Para quem já viu o Choque de Cultura ou outros trabalhos do ator, a presença dele se torna ainda mais engraçada. Além disso, todos os episódios contam com participações especiais que vão de Gretchen a Alessandra Negrini e dão ainda mais prestígio à série.

Mas apesar das qualidades, Samantha! escorrega em alguns pontos. Há um exagero e uma caricatura que são típicas do tipo de comédia que a série se propõe a fazer, e até aí tudo bem, é aceitável e divertido. Mas para mim, particularmente, Samantha! pesa demais a mão no inverossímil e no nonsense, fazendo com que a série perca um pouco o brilho. Quando as situações ficam tão mirabolantes que literalmente qualquer coisa pode acontecer, tudo que está em jogo na trama fica menos importante e, por consequência, menos divertido. Também achei que alguns pontos foram mal explicados ou mal aproveitados, como o passado e a prisão de Dodói (talvez uma deixa para a segunda temporada, já confirmada pela Netflix) e que faltam alguns momentos de empatia com a protagonista. Ela é tão egocêntrica e tão sedenta pela fama que usa todo mundo para chegar onde quer, inclusive os filhos. E apesar de mostrar um lado vulnerável com o ex-marido e com a família, ela se mostra falsa e arrogante com outros personagens e não faz questão de aprender e melhorar como pessoa. Talvez esse arco dramático também venha nas próximas temporadas. E ele só aparenta ser necessário porque a própria série tem drama embutido na comédia e pede certo nível de desenvolvimento das personagens.

Divulgação / Netflix

Samantha! é uma série complexa porque apresenta episódios quase independentes dentro de uma linha narrativa maior que forma a temporada completa (são 7 episódios apenas). Começa meio morna e vai esquentando, atingindo o ápice no quarto episódio, em que Samantha tem um embate com uma digital influencer. Mas depois a série começa a cair de novo, terminando em episódios que passam a barreira do nonsense aceitável e ficam um pouco sem graça (o jogo de verdade ou consequência no prédio abandonado no sexto episódio é indefensável). Quando tenta ser dramática, a série cai em clichês do gênero, como o velho e batido recurso do personagem escutar algo que não devia, por exemplo. Parece que usaram a saída mais fácil em algumas situações. Por outro lado, a maioria das piadas funciona e as participações especiais são muito boas, o que faz de Samantha! uma série que deve sim ser vista por quem gosta de comédia. Agora, um aviso para quem assistir: boa sorte tentando tirar a música dos Plimplons da cabeça. O negócio gruda igual chiclete.

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Renato Rodrigues é formado em Imagem e Som pela Universidade Federal de São Carlos, com pós-graduação em roteiro para Cinema e TV pela FAAP. Acredita que alguém pode gostar de Friends e de How I Met Your Mother em iguais proporções
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