3 documentários na corrida pelo Oscar 2018 da Netflix que você precisa ver

Victor Fonseca
9 Min de Leitura

Um complexo e sofisticado esquema de doping em massa de atletas olímpicos, envolvendo uma conspiração governamental russa. A incessante luta de três mulheres contra uma epidemia de overdoses de heroína em uma cidade decadente dos Estados Unidos. As marcas da injustiça e do racismo institucional em uma família americana. Estas são as histórias retratadas pelos documentários produzidos pela Netflix que estão concorrendo à entrega do Oscar 2018, nas categorias de Melhor Documentário em Curta-Metragem e Melhor Documentário em Longa-Metragem.

A gigante do serviço de streaming apresenta  três documentários com relatos dramáticos e impressionantes, capazes de fomentar discussões sobre temas extremamente relevantes no contexto político, econômico e social que vivemos. Confira a lista:

Ícaro (2017)

Querer voar alto e muito próximo do Sol tem seu preço. O documentário Ícaro (título original: Icarus), dirigido pelo estadunidense Brian Fogel, nos apresenta a surpreendente história do químico russo, Grigory Rodchenkov, um cientista extremamente inteligente que acabou se tornando um dos responsáveis pelo gigantesco esquema de doping dos atletas russos nas últimas edições dos Jogos Olímpicos, verão e inverno.

O Doc tem início com o atleta amador e também diretor, Brian, investigando os efeitos do uso de substâncias ilegais em seu desempenho esportivo e as possibilidades da utilização de doping em competições nas quais o método é proibido, de forma que esta trapaça passasse desapercebida pelos exames e métodos de checagem. Para conseguir essa proeza, Brian passa a se comunicar por chamadas de vídeo com o então diretor do laboratório nacional de antidoping da Rússia, Grigory Rodchenkov, que instrui o diretor sobre as substâncias que deveria tomar e como deveria proceder para alcançar seu objetivo.

No decorrer do longa, a história acaba tomando um outro rumo, o escândalo do uso de substâncias ilegais pela grande maioria dos atletas russos durante as olimpíadas, principalmente nas de inverno, sediadas no país (Sochi, 2014), estoura e toma conta de toda a imprensa mundial. O químico se vê obrigado a buscar refúgio nos Estados Unidos, para fugir das ameaças de morte de agentes do governo ao qual serviu, em um esquema visto por muitos como uma grande conspiração.

A produção, que concorre na categoria de Melhor Documentário em Longa-Metragem, mostra um outro lado de Grigory, um homem aparentemente divertido, que tem uma longa relação com o esporte, desde que competia correndo nos tempos de faculdade, uma pessoa politizada e que tece várias críticas ao sistema político do seu país. O cientista relata os momentos em que foi vítima de retaliações por figuras envolvidas com o governo russo, fatos que levaram à sua prisão e uma tentativa de suicídio, além de fornecer dados inéditos sobre a rede criada por agentes políticos para a elaboração do esquema ilegal

A imagem construída ao longo da narrativa é mais complexa e humanizada, se contrapondo às descrições feitas pelo governo e imprensa russa acerca do químico que foi responsabilizado pelo gigantesco escândalo que chocou o mundo do esporte.

Heroína(s) (2017)

Na disputa pelo prêmio pelo Oscar de Melhor Documentário em Curta-Metragem, dirigido e produzido por Elaine McMillion, Heroína(s) (Heroin(e), 2017) é uma produção que traz registros emocionantes da luta diária de três mulheres, duas servidoras públicas e uma missionária, para fazer a diferença na vida dos moradores da cidade de Huntington, em West Virginia (EUA).

A cidade retratada sofre com uma epidemia de opioides, batendo recordes no número de ocorrências e mortes por overdose no país, causadas principalmente pelo uso de heroína. Os moradores do local se deparam com um ciclo de dependência química, desistência escolar, criminalidade e decadência econômica, que parece se retroalimentar em suas etapas. As imagens registradas sobre esse fenômeno nos fornecem dados extremamente preocupantes e histórias realmente dolorosas sobre a vivência desses habitantes, provocando a reflexão sobre os efeitos do uso descontrolado de fármacos e a falta de informação/educação básica, somados à pobreza e questões como ansiedade e depressão, na vida das pessoa que acabam se tornando usuárias de heroína e outras drogas.

Mas além da denúncia, o documentário também é capaz de tocar no telespectador através da esperança que nasce do trabalho da chefe do departamento de bombeiros, Jan Rader, da missionária Necia Freeman e da juíza Patricia Keller. Capazes de mostrar a importância da empatia e da compreensão do contexto  social que cerca os usuários dependentes de drogas, essas três mulheres realizam um trabalho extremamente humanizado na tentativa mostrar uma saída para essas pessoas.

Ao assistir a pesada rotina dessas profissionais é possível notar problemas do sistema, que por vezes impedem ou interferem no salvamento e reabilitação dos usuários, como a falta de acompanhamento médico e psicológico, fornecido por pessoas preparadas para lidar com dependentes químicos, e restrições quanto ao uso de determinadas ferramentas para impedir a morte por overdose. São essas faltas que as protagonistas do documentário lutam para que sejam reconhecidas e supridas.

Jan, Necia e Patricia além de promoverem uma mudança profunda na vida dos indivíduos da comunidade em que atuam,  ainda representam uma grande conquista e avanço para a sociedade na luta por equidade entre os sexos, ao realizarem um trabalho extremamente importante, e com excelência na forma em que o executam, em posições profissionais antes dominadas por figuras exclusivamente masculinas.

Strong Island (2017)

Escrito e dirigido por Yance Ford, Strong Island conta a história do seu irmão mais velho, William Ford, cidadão afro-americano assassinado em 1992, com apenas 24 anos. O cineasta reconstrói a narrativa através de relatos de amigos e familiares de William, principalmente ele e sua mãe, contando aspectos da formação da família e infância dos irmãos, contextualizando-os social e historicamente.

O documentário aborda a temática do racismo institucionalizado nos Estados Unidos, trazendo o assunto de uma maneira mais delicada (mas não suave), ainda que tratando de um tema extremamente pesado. Ao invés de apresentar dados coletivos e estatísticas, o filme se constrói a partir dos danos emocionais e psicológicos na família da vítima, causados tanto pelo luto da morte, quanto pela falta de atuação da justiça, relativa ao atendimento do jovem, julgamento e investigação do caso.

A produção ainda traça um paralelo entre o atendimento do irmão do diretor, negligenciado e cujo julgamento por homicídio foi negado por um júri formado por cidadãos brancos, com um caso semelhante, no qual a vítima era um funcionário do Estado, branco, que, ao sofrer um disparo por arma de fogo, mobilizou todo um esquema de atendimento, no qual se chegou a fechar uma ponte para que fosse socorrido.

O filme concorre na categoria Melhor Documentário em Longa-Metragem, e com um ritmo mais lento, por vezes arrastado, em muitos momentos acaba nos provocando angústia e desconforto, talvez um recurso narrativo  que expresse a negligência do sistema judiciário americano e a contínua espera da família Ford por justiça.

Você pode checar a lista completa de indicados ao Oscar aqui.

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Estudante de Jornalismo, mas formado em medicina após 14 temporadas de Grey's Anatomy. Viciado em séries e amante do cinema.
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